Jornalistas dizem ter medo e revelam ameaças de morte

Portal IG

A morte do jornalista Décio Sá, repórter de
política do jornal “O Estado do Maranhão”, veículo de comunicação da
família Sarney e titular do blog com a maior audiência no Estado, trouxe uma
sensação de pânico e medo à imprensa maranhense. De quebra, expôs feridas antes
consideradas pontuais e mostrou que tentativas de cerceamento à liberdade de
imprensa no Estado são mais comuns do que se imagina.

Apenas nos últimos três anos, vários jornalistas e
veículos foram censurados ou sofreram tentativa de cerceamento da liberdade de
imprensa. Em 2010, o repórter Itevaldo Júnior, editor de Política de “O
Estado” e dono de um blog especializado na análise do Poder Judiciário
maranhense, foi proibido de citar o nome do juiz Nemias Nunes Carvalho após uma
denúncia segundo a qual o magistrado teria, supostamente, comprado uma fazenda
de uma foragida da justiça beneficiada por uma decisão judicial de Carvalho.

Um ano antes, uma outra decisão da Justiça do
Maranhão obrigou o “Jornal Pequeno”, veículo de oposição à Família Sarney, a
retirar do site uma reportagem com dados da Operação Factor, que citava o nome do
empresário Fernando Sarney. No ano passado, a repórter Carla Lima, de O Estado
do Maranhão, foi agredida por seguranças do prefeito de São Luís João Castelo
(PSDB). O Estado faz oposição à prefeitura da capital.

Os chamados bloqueiros são os mais ameaçados no
Estado. Alguns já receberam ligações ou comentários anônimos com ameaças de
morte por causa das postagens de suas páginas pessoais.
O blogueiro Caio
Hostílio que já responde a 86 processos impetrados por políticos e gestores
públicos que foram alvo de denúncias é um destes casos. Ele foi um dos maiores
críticos da greve da Polícia Militar ocorrida no final do ano passado. “Com a
morte do Décio, percebemos que os comentários com ameaças podem se cumprir a
qualquer momento”, disse Hostílio.

O jornalista Marco Aurélio D’Eça, repórter de
política de “O Estado do Maranhão”, também tem sido constantemente
alvo de ameaças. Alvo de seis processos, D’Eça disse que a morte de Décio
obrigou todos os jornalistas a mudarem hábitos e rotinas no Estado. “Eu não
ando mais tranquilo. Quando uma moto chega próxima do meu carro, surge o receio
de que algo aconteça”, afirmou. “Se eles conseguiram matar Décio, que era o
braço direito de Sarney, o que não podem fazer com gente que é
‘peixe-pequeno’”, complementou o jornalista Marcelo Vieira, também titular de
um blog sobre política.

Neto Ferreira
Após a morte de Décio Sá, pelo menos dois
jornalistas foram ameaçados de morte. O repórter Neto Ferreira recebeu uma
mensagem de um internauta segundo o qual “logo logo calaria o blogueiro”.
O
jornalista Gilberto Léda também recebeu ameaças horas depois. Os dois casos
foram denunciados ao secretário de Segurança do Maranhão, Aluísio Mendes. Antes
da execução de Sá, Mendes já tinha informações de ameaças de morte contra
jornalistas maranhenses.

Segundo colegas de Sá, ele mesmo foi ameaçado, mas
não procurou ajuda. Sá era acostumado com esse tipo de intimidação. Polêmico,
era alvo constante de agressões verbais e tentativas de intimidação. Em 2006,
durante a cobertura das eleições gerais, Sá evitou ir ao Tribunal Regional
Eleitoral (TRE) do Estado após defender publicamente em seu blog a eleição da
Roseana Sarney (PMDB). Roseana perdeu aquela eleição para o já falecido Jackson
Lago. Na cobertura diária de política, Décio dificilmente frequentava eventos
promovidos por opositores ao grupo Sarney com receio de eventuais agressões
físicas ou verbais.

Décio Sá era considerado um jornalista com muitos
amigos e muitos inimigos. Os aliados viam nele um cidadão ímpar, um repórter de
primeira linha; os adversários criticaram o seu exercício jornalístico. Segundo
eles, às vezes na base da “chantagem e busca de interesses pessoais”. “Tem essa
acusação, mas Décio era um cara inocente. Ele morreu porque foi usado. De certa
forma foram as pessoas que usaram o blog do Décio para denunciar que mataram
ele”, defendeu Caio Hostílio.

Uma mostra dessa dicotomia em torno do nome do
jornalista envolveu o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos
Advogados do Brasil, seccional Maranhão (OAB-MA), Luís Antônio Pedrosa. Ele
divulgou um texto em seu blog pessoal na qual afirmou. “Não derramei lágrimas
de crocodilo no velório, no qual não aceitaria confortavelmente comparecer.
Sempre discordei dessa linha de jornalismo, que, no Estado, é composta por um
pequeno número de gorilas diplomados”. A frase gerou revolta na categoria e ensejou
uma representação do Sindicato dos Jornalistas contra Pedrosa junto à OAB.

Nessa semana, a Polícia Civil do Maranhão decretou
sigilo das investigações. Um suspeito foi preso e mais duas prisões preventivas
foram decretadas. O caso é tratado como prioridade absoluta pela Policia do
Maranhão. O inquérito conta com a análise de 22,7 mil itens e mais de 1,8 mi
ligações feitas por Sá.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *